Ainda em função das contingências…
Todos aqueles que se encontram nos mundos da arte, política, religião, direito e economia – que são subsistemas do sistema social – são, primeiramente, Observadores. A função do Observador é identificar as fenomenologias que possam ser construídas como ciências sociais, portanto, são teóricos sociais, construções cognitivas. O que significa dizer que são “poetas” sociais. O relato de poucas linhas pode ser comprovado na realidade guarabirense na arte de ELIAS DOS SANTOS, na sua fabulosa “poesia” da pintura intitulada Geometria do Imaginário. Na sua diversidade complexa de “poesia” da pintura há uma, em especial, que nos fascina, que é nominada de O Nascimento da Ideia. Esta é a função, por outras letras, do Observador, interpretar quanto ao nascimento da ideia, que se encontra diante dos seus olhos, que deverá ser elevada ao status de ciência. O processo de cientificar uma ideia e, portanto, construir realidade social que vai iniciar a construção arquitetônica da civilidade.
O dia era 4, o mês outubro e o ano 2012, quando convencemos o Prof. RAFFAELE DE GIORGI a vir a Paraíba. Mais ainda, a vir ao Centro de Humanidades da Universidade Estadual da Paraíba (CH UEPB), falar aos estudantes do curso de Direito. Formamos uma mesa no Auditório de Humanidades, os Professores Luciano Nascimento Silva, Belarmino Mariano Neto, Fábio Henrique Sousa e Rita de Cassia Rocha Cavalcante.
O Prof. DE GIORGI discursou sobre “Teoria da Sociedade e Sistema do Direito”, numa perspectiva do pensamento pós-estruturalista, sistêmico e radical. Todos os presentes à conferência ficaram entusiasmados com os pensamentos sociológicos e jurídicos de DE GIORGI. No entanto, estas pouquíssimas linhas não se prestem exatamente a discorrer sobre a verbalização de DE GIORGI naquela oportunidade, mas sim sobre algumas lições colhidas com o pensador de Campone ou da Masseria.
Dias antes, ainda na cidade de João Pessoa fizemos alguns passeios com DE GIORGI, na companhia do nosso amigo GUSTAVO SVENSON. Ao percorrermos a cidade, logo no início do segundo dia, um pouco antes do horário de almoço, DE GIORGI me chama a atenção para algo que ele reputou instigante:
Luciano, mio caro… cosa sucede cui in brasile?
Scusa, comè professore? Non ho capito la domanda – indago imediatamente
Dizia DE GIORGI,
Senti, Luciano. Questo svilluppo economico brasiliano, non significa um svilluppo umano. Dico: la economia va benissima, non si puoi dire niente. Però, questo svilluppo economico a creato una “società dei consumatori”, quindi, non riusciamo a vedere una “società dei cittadini”. Cui, sono tutti consumatori, non cittaddini. Non si vede, in ogni posto, una persona a leggere um libro, quale sia. È incredibile, la cultura è stata dimenticata, il pensiero è stato dimenticato, le idee sono stati dimenticate.
Sem palavras, sem argumentos…
Os manifestantes que invadem as ruas das grandes metrópoles brasileiras impunham slogans os mais diversos, porém o conteúdo de pensamento e ideia é ZERO. Movimentos que se auto-intitulam de manifestações sociais de luta por direitos, trazem consigo slogans como, p. ex., O gigante acordou, que pertence à publicidade da JOHNNY WALKER; Vem pra rua, vem, anúncio da FIAT na esteira da política governamental de privilegiar o transporte individual em substituição ao transporte público de qualidade. Ou os anúncios publicitários da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL para um acesso ao crédito, que levará unicamente ao consumo. O que revela alienação político-social.
A “sociedade” brasileira do consumo de carros, máquinas de lavar, aparelhos de dvd, tv lcd, notebook, tablet, ipad, internet de banda larga, música de plástico, alimentação de fast food etc., com suas manifestações pode ser que esteja esboçando sua insatisfação com os políticos? As análises sociológicas dizem que há um desencanto com os políticos. Mas a afirmação sociológica oculta um paradoxo: como pode uma população alienada produzir cognitividade em forma de manfestação social? Alienados que produzem cognição? Não há cognitividade alguma nas manifestações. Podem existir sim, dois elementos essenciais:
a) uma reivindicação por serviços públicos que agora desejam ser gratuitos como, p. ex., o passe livre nos transportes públicos. Luta pela gratuidade do transporte público para estudarem mais, renovarem suas leituras nas escolas e universidades, formularem projetos de pesquisa e investigação científica? Dúvida. Ou o objetivo é obter um “veículo” sem “custos” para atingirem novos estágios de consumo, continuar com a escalada do consumo?;
b) manifestantes dos manifestantes. Explicação: manifestantes infiltrados, com a metodologia da livre circulação sem fronteiras (estados da federação), colocados estrategicamente nos lugares, horários e manifestações selecionadas, construção dos adversários políticos de plantão, que acontece em qualquer regime político: democrático ou totalitário. Aqui se pode perceber cognição estratégica.
Quanto à argumentação central do passe livre no transporte municipal da cidade de São Paulo, os jovens estudantes parecem não Observar a ingenuidade da propositura, não conseguem montar planos de cognição estratégica. Quando a primeira mulher, LUÍZA ERUNDINA (nordestina, paraibana) venceu a eleição para a Prefeitura da maior cidade da América Latina (1989), o transporte público na cidade era operado por uma companhia da Prefeitura, a CMTC – Companhia Metropolitana de Transporte Coletivo, e numa menor parte por empresas privadas. A prefeita elaborou um plano de transporte público com tarifa zero (vide texto de MARILENA CHAUI “As manifestações de junho de 2013 na cidade de São Paulo” no http://www.viomundo.com.br), a qual seria subsidiada pela tributação de um IPTU progressivo aplicado aos imóveis dos mais ricos.
Lembra MARILENA CHAUI que:
Na medida que os mais ricos, como pessoas privadas, têm serviçais domésticos que usam o transporte público, e, como empresários, têm funcionários usuários desse mesmo transporte, uma forma de realizar a transferência de renda, que é base da justiça social, seria exatamente fazer com que uma parte do subsídio viesse do novo IPTU.
Os jovens manifestantes de hoje desconhecem o que se passou: comerciantes fecharam ruas inteiras, empresários ameaçaram lockout das empresas, nos “bairros nobres” foram feitas manifestações contra o “totalitarismo comunista” da prefeita e os poderosos da cidade “negociaram” com os vereadores a não aprovação do projeto de lei.
A Tarifa Zero não foi implantada. Discutida na forma de democracia participativa, apresentada com lisura e ética política, sem qualquer mancha possível de corrupção, a proposta foi rejeitada (“As manifestações de junho de 2013 na cidade de São Paulo”. Disponível: http://www.viomundo.com.br, acesso em 27.06.2013)
Os manifestantes do Movimento Passe Livre precisam voltar ao século XIX e fazer a leitura dos textos de TOBIAS BARRETO, com a finalidade de Observarem quanto ao nascimento de uma idéia, a luta por um transporte público de qualidade e gratuito na significa uma “entidade metafísica”. Devem interpretar que “não se crava o ferro no âmago do madeiro com uma só pancada de martelo, é mister bater cem vezes e cem vezes repetir”, porém com estratégia, não com arroaças, vandalismo e depredação do patrimônio público. A conquista de uma tarifa zero não será produto do céu, do divino, assim como não será fruto da força física que nega toda a capacidade cognitiva do humano.
A conquista, se ela vier, será nas bases teóricas formuladas por TOBIAS BARRETO, quando lecionou que “serpens nisi serpentem comederit, non fit draco, a serpe que não devora a serpe não se faz dragão”. Trata-se de um Cosmos de forças, a conquista será “um produto da lei do fieri”, da lei cognitiva da força, a força não pode ser física, mas sim cognitiva e estratégica.
Uma juventude que vai às ruas sem cognição, não faz História. Mais ainda, a História é o que a História diz ser História. Só a História pode dizer o que é História. Lembremos daquele que é, sem dúvida, o mais importante revolucionário das Américas, ERNESTO CHE GUEVARA, que pagou com a vida para uma possibilidade de nascimento de uma América Latina Una, sem fronteiras formais de língua, cultura, política, economia. O sistema capitalista, na sua metamorfose infindável, transformou CHE num produto de consumo: camisetas, boinas, charutos, fotografias. Os símbolos de uma revolução real transformados em produtos fashion do supercapitalismo de consumo.
Esperemos, agora, pela pausa das contingências, para iniciarmos a comunicação sobre o tema da maioridade penal.