Por Alexandre Henriques

Como é seu nome?
– Antônio Inácio da Silva, mas também me chamam de Antônio Virgolino.
Qual a sua profissão?
– Eu era comerciante, hoje fabrico cachaça.
Com estas perguntas e respostas típicas de uma entrevista, quem sabe de uma qualificação civil, já daria para se fazer inevitáveis associações.
Viria então mais um questionamento.
Qual a cachaça que o senhor fabrica?
– Serra Limpa! – Responderia o entrevistado com uma ponta de necessário orgulho e justificado entusiasmo.
Essas primeiras respostas já serviriam, de plano, para quebrar o formalismo do entrevistador, que iria buscar na memória palatável o sabor da cachaça. Em sendo paraibano, lhe acorreria o sentimento de pertença com relação ao lugar onde foi criada, sob a égide da simplicidade, a bebida que se tornou uma preferência nacional e hoje é consumida com muito gosto em vários países do mundo.
Há pouco tempo Antônio nos deixou, mas apenas fisicamente. Antônio que era um Virgolino na coragem e um Inácio da Silva no talento, ficará na lembrança de todos como um cidadão de conduta irrepreensível, além de um industrial modelo, que teve o olhar permanentemente voltado para o futuro. Antônio Inácio foi o autor de um feito que exigiu muito trabalho, ética, persistência e uma exagerada dose de paixão, tudo traduzido no grau de excelência que alcançou na fabricação do que pode ser considerado um verdadeiro néctar.
A cachaça assinada por esse Virgolino, que ao mesmo tempo também é um Inácio da Silva, representa o trabalho de décadas, que começou por conquistar os de perto, como se fosse um santo de casa a operar o milagre da preferência. Em seguida, ultrapassou as fronteiras do Estado e depois as do País.
Para falar da Serra Limpa, podemos começar dizendo que a cachaça possuía e possui, respectivamente, dentre tantos outros, dois apreciadores de peso, sendo um o Bispo Diocesano da Paraíba, dom José Maria Pires (já falecido) e o outro, o ex-presidente Lula. O primeiro, mineiro, da terra das boas cachaças, o segundo, nordestino, do lugar onde se fabricam as melhores brancas, com o perdão do meu ufanismo.
Para dizer sobre a pluralidade do homem simples, impõe-se lembrar que tanto no Virgolino como no Inácio da Silva, o criador da Serra Limpa já carregava, coincidentemente, a marca forte de dois símbolos nordestinos.
Obstinado, Antônio deu curso ao seu projeto industrial de um pouco mais de três décadas, usando com sabedoria toda a experiência empírica acumulada ao longo dos anos pelo setor, mas sem esquecer a ciência, à qual se filiou desde o início, através da Escola de Agronomia de Areia-PB. Não só da UFPB de Areia, mas também de outros centros especializados no estudo e na pesquisa sobre a produção de cachaça.
Ao alcançar com a qualidade do seu produto o paladar e os corações dos consumidores, estacionou a bebida nesse patamar e, a partir desse ponto, nunca cedeu aos encantos do aumento da produção em detrimento da qualidade, mesmo com a imensa procura e a oferta muitas vezes limitada.
Na esteira da construção de uma das marcas de cachaça mais respeitadas do Brasil, Antônio Inácio lega aos produtores da bebida na Paraíba uma edificação sólida, dado à respeitabilidade adquirida pelo produto ao longo dos últimos anos, fruto, em grande parte, do seu devotado trabalho de fabricação e divulgação da marca cachaça como um produto de primeira grandeza, uma verdadeira joia do setor sucroalcooleiro da Paraíba.
Antes fartamente adulterada, tratada por comerciantes e bebedores de forma pejorativa como cabumba e incha pé, a cachaça não tinha a sua origem certificada pelos rótulos ou, às vezes, iam parar em garrafas bonitas de conteúdos duvidosos.
Barata e no mais das vezes de baixíssima qualidade, a bebida não tinha lugar nas cartas dos bons restaurantes, sempre fartas de whiskies nacionais e importados. Hoje a Serra Limpa e outras cachaças do brejo da Paraíba, a exemplo da D’Dil, Rainha e Volúpia aparecem nos cardápios com o preço equiparado ao da dose de um bom scotch.
Por quem foi, pelo que construiu, pela simplicidade com a qual transitou pela vida, edificando um exemplo e uma referência, Antônio Inácio protagonizou uma história de sucesso, digna do respeito de todos os paraibanos. Criou e foi guardião zeloso de uma marca que nos orgulha e confere respeito não só dos consumidores, mas a todo o setor produtivo.
Que a família, agora guardiã do tesouro, siga a trilha traçada pelo seu criador. Esta será a melhor maneira de homenageá-lo.

Alexandre Henriques é cronista, fotógrafo-multimídia